terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Moralidade - Olavo de Carvalho

Moralidade é consciência, é discernimento pessoal, é busca de uma meta de perfeição que só aos poucos vai se esclarecendo e encontrando seus meios de realização entre as contradições e ambigüidades da vida.

(encontrado online AQUI)
Olavo de Carvalho

domingo, 15 de novembro de 2009

Buscar o concerto - Vergílio Ferreira


"estou onde? A princípio estávamos de acordo, porque a verdade é simples e eu tinha-a. Tão simples, que todos se perguntavam 'como foi possível ignorá-la?' Mas o que é simples é que se não vê. O que está diante dos olhos é que se não vê. É preciso passar por todo o labirinto do erro, é preciso sofrer tudo o que se sofreu pelo que nunca existiu para se saber. A história do homem é a história dos seus fantasmas. As pessoas não pensam, eu penso. Através dos séculos as pessoas deram urros de gozo, de ódio, esfolaram-se mútuamente, queimaram a vida - porquê? Houve os que viveram em cima duma coluna, os que passaram a vida numa dieta de raiz e gafanhoto, os que morreram por um homem que também morreu, os que morreram por uma idéia, e os que morreram por outra idéia que veio logo a seguir e só durou equanto se estava distraído a ver que a anterior afinal já não era idéia nenhuma, os que lutaram a vida inteira para tirar o chicote das mãos de um tipo e metê-lo nas mãos de outro tipo que dava mais gozo quando chicoteava, os que se puseram à roda de uma palavra e se bateram como leões contra os que estavam à roda de outra palavra que queria dizer o mesmo, os que se mataram por uma questão de águas, os que se mataram por uma sardinha, os que levaram a vida inteira à espera de ter razão e quando era a altura de a terem, já não servia, os que jogaram tudo no futuro que lhes fez manguitos e os achou tão patuscos, os que foram idiotas, os cretinos, os petulantes - ó farrapada humana, velha ferraria corroída de ferrugem, lixeira de uma obstinada estupidez. Daqui da minha solidão, frente ao mar, daqui vos cago em cima. E vos admiro com uma veemência humedecida."

(Vergílio Ferreira in Nítido Nulo, p.231-232, 1969)

sábado, 31 de outubro de 2009

Perspectiva - Neil Armstrong

Tudo entra em perspectiva agora,
de pensar que naquela linda e brilhante esfera
guerras sao lutadas
tempestades destroem
pessoas nascem
pessoas morrem
nosso conflito humano
nossa paixao
nossa dor
seguem sob o véu de um azul anuviado

(Neil Armstrong - o primeiro homem que pisou na lua)

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Saudade de pedra - Fernando Pessoa

"Ah, todo o cais é uma saudade de pedra!
E quando o navio larga do cais
E se repara de repente que se abriu um espaço
Entre o cais e o navio,
Vem-me, não sei porquê, uma angústia recente,
Uma névoa de sentimentos de tristeza
Que brilha ao sol das minhas angústias relvadas
Como a primeira janela onde a madrugada bate,
E me envolve com uma recordação duma outra pessoa
Que fosse misteriosamente minha."

Fernando Pessoa in Ode Marítima

músicas - Sávio

"alvoraçadas as folhas só sabem cantar"

Sávio

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Passo em falso - Vergílio Ferreira


“...Se tu soubesses como é difícil. Ter a verdade inteira nas mãos e ela não ser. Saber que é a verdade da vida e a vida dizer não. Como a mulher que nos deseja e nos recusa, nunca soube porquê – para nos irritar? Para se valorizar ou adiar o prazer. Pago ao graxa, atiro a moeda pelo ar para entrar no seu jogo, ele apara-a, mete-a ao bolso, afasta-se com o caixote sem dizer palavra. Saio à rua, vou pela cidade a passos vãos, à procura de entender. É o fim da tarde de um dia de Inverno. Reconheço-o nos pássaros guizalhando pelas árvores, uma melancolia retraída que no Verão não há. Vera mora um pouco longe, mas tenho tempo, apetece-me andar. É a hora viva do tráfego, as luzes acendem-se pelo ar, as vitrinas iluminam-se – e se soubesses como é difícil. Porque um secreto mecanismo tudo subverteu. Não estava lá o que eu disse, não estava mesmo no programa de Teófilo – estava onde? Como bichos terrestres, os olhos acesos, passam os carros, levam a cidade toda na sua ronda – estava onde?”

Vergílio Ferreira in Nítido Nulo

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

a morte de Cyrano - do filme

Tarde demais.
Vou subir na lua brilhante,
mais uma alma que eu amo e que deve exilar-me.
Reencontrarei Sócrates e Galileu.
Filósofo, físico,
poeta, soldado
músico. E viajante dos ares.
Bom de respostas rápidas.
Amante também, mas não de si mesmo.
Um Hercule Savinien
de Cyrano de Bergerac.
Que foi tudo, e não foi nada.
Mas eu me vou,
me perdoem
não posso esperar.
Vêem? Um raio de lua vem me buscar.
Não me impeçam.
Está nas árvores.
Ela vem.
Posso ver sua beleza de mármore.
Vestida de chumbo.

Já que está lá irei de encontro a ela.
Com a espada na mão.
Eu lhe digo, é um clichê! É inútil!
Mas sei que sua resposta será não.
é bonito ainda que seja inútil.
Quem são todos aqueles ali?
São os mil?
Eu os reconheço todos os meus velhos inimigos.
as mentiras, as covardias, os compromissos.
Sei que no final irá me derrotar,
não me importo!
Me debato! Me debato!
Me debato!
Me arranque tudo,
os louros e a rosa.
Arranque! Você ainda tem alguma coisa que me importa.
Essa noite, quando entrar na casa de Deus,
minha saúde varrerá os portões azuis.
Nenhuma coisa sem uma dobra, sem uma mancha, me importa apesar de você
meu penacho...

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

na raridade do que é belo - Sávio

lambuso-me com tudo o que é belo,
nesse mundo sou criança que se abasta a todo contento!

(Sávio)

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

A formiga e a pedra - Sávio


Quem dera todos os mares fossem calmos,
os gregos teriam nos descoberto antes de cristo!
à você eu não teria chegado,
Avulso no mundo seria pela calma,
afetado comigo mesmo talvez estivesse sempre,
preso no convulso do nada.

Mas os mares são tortuosos,
meu coração bate em resposta à onda imensa que se empenha contra mim,
e meus olhos arregalados seguram qualquer coisa onde me apoiar.
Que venha onda imensa!
e somente no fundo do mar estarei contido!
pelo contrário avanço sempre,
existe uma América nova a ser descoberta!

(Sávio)

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Do frio - Vergílio Ferreira


Pelo espaço azul do céu já frio. Mas é possível que não. Na realidade, bebo e a cerveja está certa com uma sede que só havendo calor. O que há é outra coisa. O que há é esta constrição de nós, este aperto, esta aflição. O sol desce. Já o tinha dito. Tenho de o dizer mais vezes à medida que for descendo. À medida que desce, o que está no extremo do horizonte fica para cá do extremo. A gente estende-se toda no olhar. É perigoso. A gente desfaz-se em ausência. Esta constrição. Este aperto. A ilusão do frio vem daí...

Vergílio Ferreira in 'Nítido Nulo'